Andar com fé eu vou : interfaces entre escola pública do ensino fundamental e religião na periferia de Brasília

Abstract

Esta tese analisa a influência do crescimento do número de igrejas nos espaços próximos às escolas públicas, e suas relações com a comunidade escolar de Sobradinho II, Região Administrativa do Distrito Federal. Procuramos, ao longo da pesquisa, compreender a presença expressiva de comunidades evangélicas nessa região, analisando a história, as contradições e as possibilidades de diálogos nesse território urbano periférico, demarcado socialmente enquanto um lugar de desigualdades, exclusão e abandono, especialmente considerando as políticas públicas para a Educação Básica, e bem-estar das crianças, dos jovens e dos adolescentes locais. Desse modo, analisamos como a comunidade escolar estabelece suas relações sociais numa área onde o pensamento religioso conservador é predominante. Com isso, utilizamos, enquanto teoria do conhecimento, o Materialismo Histórico Dialético – MHD e a perspectiva da Pedagogia Histórico-Crítica, seu alicerce pedagógico. Realizou-se três entrevistas semiestruturadas, sendo uma pastora, liderança religiosa local e também servidora da escola, uma coordenadora pedagógica e uma professora, de modo a perfazer três grupos diferenciados de posições para a análise dos dados. Na sequência, realizamos análise documental, geográfica e bibliográfica enquanto instrumentos a possibilitar a participação das pessoas da comunidade escolar local. A intencionalidade deste trabalho consiste na árdua tarefa de problematizar o contexto econômico-social e histórico-cultural para possibilitar que estudantes da periferia possam acessar os conhecimentos construídos historicamente por meio das ciências humanas, exatas e naturais. Assim, por meio da Educação Básica, ele consiste na perspectiva de que estudantes e comunidade ao redor da escola pública possam se fortalecer de saberes e instrumentos de modo a superar as assimetrias propositais, de uma sociedade capitalista periférica, a qual se torna gradualmente naturalizada e socialmente aceita – por meio de uma ideologia conservadora propagada nas igrejas, ajustada às necessidades do ultraliberalismo, assentado nos princípios da exclusão e marginalização de uma classe social. A confirmação desta pesquisa é a de que houve o avanço dos grupos evangélicos, em especial, dos neopentecostais, junto às periferias urbanas no Distrito Federal, causando impactos na escola pública, em seu dia a dia escolar. Com isso, após um longo período hegemônico da igreja católica nos rumos da educação formal no Brasil, percebe-se a emergência política, com repercussões pedagógicas, dos evangélicos das chamadas “igrejas de massa”, vinculadas à Teologia da Prosperidade, enquanto doutrina filosófica-teológica-política. Por meio de uma inserção no campo ao longo da pesquisa se pôde compreender em que medida essa influência pode ser percebida no cotidiano escolar, alertando e aprofundando a permanente e intransigente vigilância por parte da sociedade civil, do Estado e da academia na defesa incondicional da laicidade da

educação pública. Diante do cenário político pós-2018, trata-se de uma tarefa corajosa e necessária empreender esforços ao desvelar a materialidade do “chão da escola”, enquanto espaço de constante e ininterrupta disputa de narrativas político-científicas, e por que não religiosas, tendo em vista que os chamados temas tabus ligados à discussão de gênero, às políticas reprodutivas, e à racialidade ainda emergem enquanto lugares de resistência e contra hegemonia no espaço da Educação Básica.