A concepção da investigação científica em políticas curriculares : entre regulações e sistemas de raciocínio

Abstract

O Novo Ensino Médio, desenvolvido a partir da Lei nº 13.415 de 2017, é composto, além dos componentes curriculares da Formação Geral Básica, por uma porção curricular flexível denominada Itinerários Formativos, cujas unidades curriculares devem se desenvolver em torno de pelo menos um entre quatro eixos estruturantes possíveis: ‘Investigação Científica’, ‘Processos Criativos’, ‘Mediação e Intervenção Sociocultural’ e ‘Empreendedorismo’. Sendo a ‘investigação científica’ um enunciado historicamente caro ao ensino de ciências, o objetivo deste trabalho é analisar as condições de emergência desse enunciado dentre as políticas curriculares, com a sua consequente fixação como um dos eixos estruturantes responsáveis por embasar unidades curriculares referentes a todas as áreas do conhecimento. Como suporte para tal estudo, apresento um panorama histórico referente à investigação científica ao longo da trajetória do ensino de ciências no Brasil e um levantamento bibliográfico concernente ao tema com o propósito de visibilizar diferentes sentidos já incorporados a esse enunciado nos campos discursivos educacional e epistêmico, e os processos envolvidos na produção de um sistema de raciocínio que regula a elaboração das políticas curriculares, aceitando e legitimando determinados enunciados. Baseandome em uma análise enunciativa inspirada em estudos foucaultianos busco evidenciar como a ‘investigação científica’ adquire hoje uma abordagem tipicamente escolar no campo discursivo do ensino de ciências, com os significados que a constituem em muito se aproximando da ‘alfabetização científica’ e do ‘ensino de ciências por investigação’. Em diálogo com o ciclo contínuo de produção de políticas, privilegio a análise da Base Nacional Comum Curricular e do Currículo em Movimento do Novo Ensino Médio, documentos normativos que regem a estruturação curricular, com a intenção de compreender como eles vêm acionando esse enunciado, encontrando sentidos próximos àqueles praticados pelo meio acadêmico. Por fim, fundamentada na teoria da atuação, elaborada por Stephen Ball e colaboradores, examino os catálogos das unidades curriculares dos itinerários formativos da Secretaria de Estado de Educação do Distrito Federal buscando compreender como o eixo estruturante da investigação científica vem sendo interpretado e traduzido nas suas ementas. Percebo que, apesar de notoriamente caro aos professores da área de Ciências Naturais, o termo ‘investigação científica’ carrega uma multiplicidade de sentidos, sendo muitas vezes utilizado em discordância com o que vimos entendendo e denominando como ‘investigação científica escolar’. Destaco, assim, a necessidade de uma maior sistematização de informações e subsídios metodológicos por parte das políticas curriculares acerca do desenvolvimento dessa abordagem.