Dinâmicas das políticas públicas de educação básica no Brasil : a inclusão da agenda étnico-racial negra (2003-2022)

Abstract

A presente tese trata dos mecanismos causais das ‘mudanças nas políticas públicas’, a partir do estudo de caso sobre a educação básica nacional no Brasil, entre 2003 e 2022, com foco na incorporação da Agenda Étnico-Racial Negra (AERN). As principais mudanças analisadas são: a marcação de raça/cor no Censo Escolar em 2005; a incorporação da AERN no Plano Nacional de Educação (PNE) 2014-2024; e a aprovação da Base Nacional Comum Curricular (BNCC) em 2017 e 2018, além da criação e extinção da Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão (Secadi). A revisão bibliográfica identificou que há lacunas na literatura para analisar a AERN na educação básica nacional e o Advocacy Coalition Framework (ACF) foi utilizado como marco analítico para suprir as lacunas. A análise abrangeu as seguintes categorias: eventos externos (coalizões político-partidárias/quadro político institucional, organismos internacionais e outros subsistemas); e eventos internos (atores principais, sistemas de crenças, coalizões, empreendedores e mediadores de políticas públicas e estratégias utilizadas, além de dinâmicas de conflitos, aprendizagem e/ou acordos negociados). A metodologia utilizada foi baseada no rastreamento de processos (Process Tracing), a partir de dados bibliográficos, documentais e entrevistas, com análises por meio do software MAXQDA. Os resultados identificaram a dinâmica das crenças e das 3 (três) coalizões mapeadas no subsistema de educação básica nacional ao longo dos períodos analisados: a coalizão pró-financiamento, dominante de 2003 a 2010; uma transição entre as coalizões, de 2011 a 2014; a coalizão pró-gestão, dominante de 2015 a 2018; e uma coalizão nascente, denominada familista padronizada, dominante de 2019 a 2022. A análise revelou que o subsistema de educação básica no Brasil está baseado em duas coalizões maduras e estáveis, com características de adversárias pouco colaborativas. Duas hipóteses foram confirmadas e uma parcialmente confirmada. A primeira hipótese é de que há duas coalizões maduras no subsistema de educação básica que não internalizaram a AERN, apesar da afinidade das coalizões com a agenda. Essa hipótese foi confirmada. A segunda hipótese trata da centralidade da atuação de moderadores (Policy Brokers) e a articulação com empreendedores de ideias em políticas públicas (Policy Entrepreneurs) para a implementação das mudanças em relação a AERN, como mecanismos causais centrais. Essa hipótese foi confirmada, por meio da atuação, sobretudo, de Secretários da Secadi/MEC. A terceira hipótese foi parcialmente confirmada, demonstrando que a ação sistemática do subsistema de igualdade racial, centralizado na Seppir, atuou para a incorporação da AERN na educação, enquanto mecanismo causal, mas somente até 2012 e associada a outros fatores. As mudanças pró equidade na educação básica nacional, considerando a AERN, foram impulsionadas pelos seguintes mecanismos causais: coalizão político-partidária no poder associada ao quadro político institucional do setor; advocacy de organismos internacionais; e a atuação contínua de empreendedores e mediadores, junto a coalizões e atores específicos. A pesquisa destaca a importância da coordenação entre diferentes atores e estratégias de apoio para promover mudanças significativas na AERN e o desafio de maior interlocução com as coalizões do subsistema, ou seja, a centralidade das coalizões nas análises das mudanças em política públicas.