Ler Conceição Evaristo no ensino de literatura - por um currículo amefricano

Abstract

As relações étnico-raciais no Brasil são permeadas pela sombra do mito da democracia racial, muito difundido no início do século XX, e a força da produção literária amplificou essa ideia, a qual foi convenientemente abraçada pela elite branca da época e até hoje encobre práticas de racismo. Diante desse cenário, essa pesquisa desenvolve estudos sobre ensino de literatura negra e a sua inserção nos currículos educacionais, tecendo críticas a padrões de ensino e aprendizagem colonizadoras e eurocêntricas, os quais obstaculizam a emancipação da população negra nesta sociedade racista, capitalista e patriarcal. Compreendendo que a população negra possui especificidades quanto sua vivência individual e coletiva, permeadas por uma história invisibilizada nos currículos de ensino, embora existam leis que amparem a abordagem desses conhecimentos, como a Lei 10639/2003, reivindicamos, neste trabalho, a inserção dos saberes advindos dessa comunidade nas diretrizes oficiais de ensino do país, numa perspectiva Amefricana de Lélia Gonzalez (2018, 2020), com a qual é possível ressignificar o processo de colonização e suas consequências para a população negra, valendo-se de discursos acerca do tema na perspectiva do/a colonizado/a. A partir da epistemologia do Dispositivo da Racialidade de Sueli Carneiro (2023), na qual a autora aborda os conceitos de Epistemicídio e Interdição, alicerçamos a defesa de uma educação antirracista por meio da literatura negra, tendo como representante dessa arte na educação formal a escritora Conceição Evaristo (1996, 2020) e seu conceito de Escrevivência. Na contramão dessa falácia de democracia racial, essa pesquisa revisita as políticas de formulação dos currículos por meio de sua organização nas Teorias do Currículo, destrinchando o viés ideológico eurocêntrico presente em suas estruturas, o qual ainda direciona o ensino a uma aprendizagem excludente, privilegiando a branquitude. Sendo assim, com amparo e inspiração na luta contínua do Movimento Negro para garantia do direito à educação, esse trabalho defende a necessidade da construção de uma educação literária afrocentrada, ancorada nas especificidades do povo negro brasileiro, de modo que a história e cultura africana seja contemplada nas políticas curriculares, considerando que a população do país é majoritariamente negra.