Fórmulas infantis para alergia às proteínas do leite de vaca : desafios na implementação de um programa nacional no SUS

Abstract

Introdução: A Alergia às Proteínas do Leite de Vaca - APLV representa um importante problema de saúde pública que acomete principalmente crianças. Em 2017, após ampla discussão foi aprovada a incorporação de três fórmulas infantis (aminoácidos, extensamente hidrolisada e soja) para crianças com esta alergia e que deveriam ser ofertadas pelo Sistema Único de Saúde - SUS. Objetivo: Mapear os desafios para a implementação e manutenção dos programas estaduais e municipais de fornecimento de fórmulas para fins especiais, visando o atendimento às crianças com alergia às proteínas do leite de vaca, no contexto da incorporação pelo SUS. Metodologia: estudo exploratório e, também propositivo de recorte transversal e abordagem quanti-qualitativa, a população do estudo foi formada pelos principais atores envolvidos nas discussões referentes a incorporação dessa nova tecnologia, os participantes foram agrupados em seis grupos de interesse que responderam às entrevistas semiestruturadas e coleta de dados secundários via e-mail. Resultados: As informações coletadas foram organizadas em três capítulos. No Capítulo 1 fez-se um recorte das discussões sobre a pesquisa translacional trazendo para o cenário brasileiro, que culminou no artigo, Translational research in Brazil: research topics and their adherence to the SUS Agenda que identificou 64 programas/grupos, sendo 8 programas de pós-graduação, 12 programas de pesquisa e 44 grupos na área de pesquisa translacional em saúde. Em 2019, os dados mostraram que não havia aderência entre os temas de pesquisa desses 64 programas/grupos e a Agenda de prioridades do SUS, incluindo o tema deste trabalho, embora mais recentemente editais de pesquisa foram induzidos pelo DCIT/MS/FINEP/CNPq com aderência às necessidades nacionais. No Capítulo 2 foram caracterizados os programas municipais e estaduais que dispensam fórmulas infantis para crianças com alergia às proteínas do leite de vaca. Participaram do estudo 21 programas/serviços, sendo 15 municipais e 6 estaduais das 5 regiões do País, cujo principal indutor da criação foi a judicialização. A maioria (18/21) fornece as fórmulas até 2 anos de idade e realiza acompanhamento multiprofissional. Todos os programas utilizam recursos próprios, estaduais ou municipais, sem contrapartida da União. A falta de recursos humanos especializados e financeiros, segundo os gestores locais, foram e são ainda os principais obstáculos para criação e execução desses programas. No Capítulo 3 buscou-se mapear os desafios envolvidos nesta incorporação e elencar propostas de soluções mais custo-efetiva, apoiando-se na pesquisa translacional, a partir da discussão com os principais interessados nesse processo, Governo, Setor Produtivo, Academia, Sociedade Civil e Redes de Proteção ao Aleitamento Materno. Participaram do estudo 17 profissionais-chave e, os desafios envolvendo macrogestão, questões técnicas, formação multiprofissional, imprecisão no diagnóstico e carência de estudos de prevalência precisam ser considerados a fim de se promover o uso racional dos recursos públicos e melhor assistência aos usuários que realmente necessitam deste insumo. A orientação correta para amamentação, incluindo a restrição materna de leite e derivados, contribuiria fortemente para o menor uso de fórmulas infantis. Em nível internacional, dentre os países avaliados, observase um exemplo positivo neste tema na Finlândia, o qual prevê uma clara definição de metas e ferramentas de avaliação e monitoramento, processo de diagnóstico padronizado e certificado, formação continuada para os profissionais de saúde, elaboração de campanhas educativas para o público leigo, envolvimento de pacientes e associações nas discussões e, planejamento a longo prazo, além do programa de reembolso parcial. O apoio financeiro por parte da esfera Federal ajudaria muito no contexto brasileiro para o caso do Programa APLV. Considerações Finais: A pesquisa translacional precisa de esforço para atingir suas metas neste tema no Brasil, mesmo já tendo atingido o Estágio 4. Investir em formação multiprofissional para melhorar o diagnóstico, manejo e educação do leigo da APLV bem como “olhar” para exemplos internacionais já em funcionamento adequado e eficiente são fatores relevantes para efetivar essa incorporação de forma mais benéfica à população e ao SUS.